Somos o Todo do Bem e do Mau

Somos todos o bem e o mau

"Osho diz:
 “Amor, eu sou um com todas as coisas. No momento que sei quem eu sou, no momento que vejo quem eu sou, no momento de sabedoria, eu sou um com todas as coisas,
eu não consigo perceber nenhuma divisão. Em beleza, em feiura, para o que quer que seja, aí estou, aí eu sou.

Isto eu sou. Não somente em virtude, mas em pecado também. Eu sou um parceiro não somente no céu, mas também no inferno. 


 Fomos condicionados a crer que o inferno é o outro, mas é justamente neste ponto que nasce a separação. É deste jeito, vivendo sob essa crença, que o inferno o persegue.

Se você ousar olhar com carinho para tudo que o cerca,
somente uma visão é possível: não há nem certo nem errado, nem mocinho, nem vilão. Os acontecimentos seguem condições: algumas coisas acontecem para uns, outras para outros...
Tudo acontece como tem que acontecer. Lembre-se: “Eu sou umparceiro não somente no céu, mas também no inferno”.

E Osho segue seu discurso... “Buda, Jesus, Lao Tzu... é muito fácil ser herdeiro deles. Mas Gengis Khan, Tamur, Hitler... eles também estão dentro de mim. Não há metade. Eu sou a humanidade em totalidade. O que quer que seja do homem é meu. Flores e espinhos. Tanto a escuridão quanto a luz. E se o néctar é meu e só meu, de quem é o veneno? Néctar e veneno, ambos são meus. E quem quer que seja que experiencie isto, eu chamo de religioso.”

A atitude da mente é separar o certo do errado, mas isto não é , unificador. Quando você descobre quem você é, nota que tudo pode ser acomodado dentro de você – ou, melhor, não somente pode, como essa é a única verdade, embora seja negada o tempo todo. Tudo está dentro de quem você é.

Olhe a sua volta e veja tanto o néctar quanto o veneno – ambos ocorrem na superfície, não os julgue. Esteja atento ao “ambiente” em que eles ocorrem. Nem céu, nem inferno – quem
você é, está ALÉM dos dois, e não há a menor possibilidade de ser compreendido pela mente.

A mente separa,  ..."
Mas o coração ama, une somos um.


Flores e espinhos...

























Mãe Com Todo Amor


Mãe


GUSTAV KLIMT
The Three Ages of Woman
De joelho 
“Bendita seja a Mãe que te gerou.” 
Bendito o leite que te fez crescer 
Bendito o berço aonde te embalou 
A tua ama, pra te adormecer! 

Bendita essa canção que acalentou 
Da tua vida o doce alvorecer ... 
Bendita seja a Lua, que inundou 
De luz, a Terra, só para te ver ... 

Benditos sejam todos que te amarem, 
As que em volta de ti ajoelharem 
Numa grande paixão fervente e louca! 

E se mais que eu, um dia, te quiser 
Alguém, bendita seja essa Mulher, 
Bendito seja o beijo dessa boca!! 
postado por Carla Matos    

Você terá um lindo bebê abençoado por Deus! - OrkuGifs



Minha mãe foi a primeira música que tocou no meu rádio. A primeira paisagem. A primeira pessoa que me falou sobre milagres e, sem palavra alguma, me contou sobre Deus. Uma história de amor. Tanto faz se, às vezes, desconcertado. Tanto faz se, às vezes, atrapalhado pela mistura das coisas que são dela e das coisas que são minhas. Tanto faz se aprendendo a amar junto comigo nesses bancos da escola. Tem vez que a gente demora para resolver alguns exercícios mais complicados, mas a amizade que nos liga e construímos, página a página, sempre nos orienta na busca das respostas. Minha mãe é maciez pra minha alma quando a vida se faz áspera e quando não. Um lugar de conforto, onde eu posso ser. Amor, quando as minhas folhas caem e quando floresço. A mesa sempre posta, até quando sinto fome apenas de lembrar quem sou.
Estou convencida de que ninguém me conhece melhor do que ela. Sente a emoção da vez, antes da minha voz. Sente quando omito alguma coisa, por mais sofisticados que sejam os meus disfarces. Sente a atmosfera da minhas palavras, antes que eu consiga ou resolva dizê-las. Conhece mais variações de sorrisos, silêncios e olhares meus e suas respectivas mensagens do que suponho mostrar. Ela não me conhece assim porque é versada em psicologia. Minha mãe é versada em mim, desde quando eu ainda nem era eu direito.
Ana Jácomo



Mãe, você é a presença 
em cada passo
que o tempo não apaga.
Por mais longo e obscuro
seja o caminhar,haverá sempre
tua lembrança, 
como luz a me direcionar.

"O Cravo Branco de Anna Jarvis",
a Criadora do dia das mães !

"É uma maldição que os homens tenham de mercadejar com tudo quanto é belo, santo e puro? Por favor, peça que retirem o "Dia das Mães" dos balcões e caixas registradoras.
Enfeitem-no com Bondade e Alegria, contabilizem-no no coração ! Eles podem fazer isto !".

Certo dia, em 1925, uma mulher alta e enérgica, de aspecto decidido, entrou num hotel de Filadélfia e encaminhou-se na direção de um grupo de senhoras da Associação das Mães de Veteranos de Guerra, reunidas na convenção.
Censurou-as, denunciando-as por venderem o "cravo branco", símbolo do Dia das Mães, por preços extravagantes e extorsivos. Diversas pessoas tentaram interrompê-la, mas a sua invectiva era fria e obstinada. Finalmente foi chamado um policial. A dama foi presa sob a alegação de perturbar a ordem. Assim terminava mais um incidente na atribulada carreira de Anna Jarvis, a CRIADORA DO DIA DAS MÃES.

Quando o juiz, constrangido, pôs Anna Jarvis em liberdade, um repórter foi visitá-la em sua casa, à Rua 12 Norte, em Filadélfia. A bela mulher de cabelos brancos e 60 anos de idade, estava sentada numa cadeira de espaldar reto e seu olhar estava posto no retrato de sua mãe. O jornalista perguntou-lhe:

- Por quê a senhora não desiste ? Está lutando contra o mundo, sozinha ! Deveria orgulhar-se por ser a criadora do Dia das Mães.
- O Dia das Mães foi transformado num comércio sórdido. O senhor leu o que escrevi ao Presidente Coolidge ?
O rapaz acenou afirmativamente. A carta fora publicada pelos jornais. Em um certo tópico, Anna Jarvis dizia: "Estou tentando, de todas as maneiras ao meu alcance, evitar que o Dia das Mães seja aviltado por certa classe de indivíduos e organizações que vêem nele apenas um meio para ganhar dinheiro".
- Mas. Retrucou o repórter, - afinal foi a senhora mesma quem instou durante anos para que o cravo branco fosse transformado em símbolo do Dia das Mães. Foi a senhora quem insistiu para que todos mandassem mensagens de carinho às Mães, por telegrama ou carta.
- O senhor está dizendo que o meu triunfo é, também, o meu fracasso. Está bem ! Você tem razão, meu rapaz ! Este é o paradoxo da minha vida.

Mas não era o único paradoxo na vida de Anna Jarvis. Embora fosse uma mulher extremamente bela, jamais se casara. Nascera em 1864, em Grafton, Virgínia Ocidental, onde crescera, transformando-se numa beldade esbelta e ruiva. Por quê uma jovem assim teria permanecido solteira ? Um amigo da família contou. "Anna teve um caso de amor mal sucedido e isso deixou-a abalada e desiludida. Daí por diante deu as costas a todos os homens".

Ao sair da Faculdade Mary Baldwin, em 1883, dedicara-se ao magistério em Grafton. Não que precisasse do salário. Sua mãe, viúva, gozava de boa situação. Alguns anos mais tarde, Anna, sua mãe e sua irmã mais nova, Elsinore, que era cega, mudaram-se para Filadélfia. Anna empregou-se como assistente no departamento de publicidade de uma companhia de seguros. Assim viveu dos 20 aos 40 anos. Então, em 1905, a Sra. Jarvis faleceu. Foi um golpe terrível que, entretanto, marcou o início de nova e vital etapa na vida de Anna. Contava ela, então, 41 anos, era dona de uma bela casa, tutora da irmã cega e principal beneficiária da herança materna.
Enquanto decorriam os dias longos, o coração clamando pela presença materna, uma visão tomou corpo em seu espírito: a instituição de um dia consagrado às Mães.

Sugeriu a idéia ao Prefeito Reyburn, de Filadélfia. Esse foi o início da cruzada de Anna Jarvis. O ponto básico era, - ela insistia, - a homenagem não só às mães vivas, mas, também, às mães que já haviam morrido. De sua casa, - feita quartel-general, - ela dirigiu uma das mais estranhas e eficientes campanhas epistolares de que se tem notícia. Escreveu a governadores, congressistas, clérigos, industriais, clubes femininos - a qualquer um que pudesse exercer influência. As respostas a essas cartas foram em número tão considerável, - demandavam tanta correspondência, - que Anna deixou o emprego que tinha, a fim de dedicar-se inteiramente à sua campanha.

Quando verificou que sua casa se tornara pequena para servir de escritório, comprou a casa vizinha. Em breve era convidada a visitar outras cidades para falar perante diversas organizações. Escreveu e imprimiu folhetos sobre seu plano, distribuindo-os gratuitamente. Todas essas atividades consumiram boa parte de sua fortuna, mas Anna jamais permitiu que isso a preocupasse.
Corriam os dias em que outras mulheres corajosas e enérgicas, - as célebres Sufragettes, - lutavam pelo direito do voto. Os objetivos de Anna Jarvis eram mais sentimentais, menos sujeitos a controvérsias. Como poderia um legislador combater alto tão doce, puro e cheio de beleza como um "Dia das Mães" ? E a Virgínia Ocidental foi o primeiro Estado Norte-Americano a adotar oficialmente a data festiva.

Anna Jarvis, inspirada por esses primeiros sucessos, continuou a escrever, a viajar, a fazer conferências. Em 1914, sua eloqüência persuadiu o Deputado J. Thomas Heflin, do Alabama, e o Senador Morris Sheppard, do Texas, a apresentarem uma proposta conjunta para que se observasse em toda a nação americana, o Dia das Mães. A proposta foi aprovada pelas duas casas do Congresso. O verdadeiro grande momento de Anna chegou quando o Presidente Woodrow Wilson assinou uma proclamação no qual recomendava que o Segundo Domingo de Maio (aniversário da morte da mãe de Anna), fosse observado no país inteiro como o Dia das Mães.

Todavia, para Anna, esse triunfo não era suficiente. Ainda era preciso conquistar o resto do mundo ! Assim, a correspondência, os discursos e os folhetos de exortação continuaram, agora em escala internacional. E o seu esforço foi notavelmente bem sucedido. Só no decurso de sua vida, 41 países adotaram o Dia das Mães. O BRASIL foi um deles. A 5 de Maio de 1932, o então chefe do Governo Provisório, Getúlio Vargas, promulgou oficialmente, pelo Decreto 21.366, o Segundo Domingo de Maio, o Dia das Mães.

Infelizmente o triunfo de Anna Jarvis, em breve se tornava a sua grande frustração. Ela escrevia desesperada por centenas de jornais: "Estão comercializando o meu Dia das Mães ! Não era isso que eu pretendia ! Esse é um dia de sentimentos e não de lucros !"
Anna não queria que a festa da mãe pobre fosse diferente da festa da mãe rica. Um simples cravo branco, a flor predileta de sua mãe, bastava para exprimir um Mundo de Afeto !

Ela estava atônita, inesperadamente viu-se pobre e só. A escada do templo, de onde queria expulsar os vendilhões, tornara-se uma rua comercial sem horizontes: dezenas de vezes dava a volta ao mundo. Todo o dinheiro de sua herança se fora. Então, fazendo apagar-se para sempre o seu belo sorriso, onde, durante anos tatalara asas a borboleta de ouro de suas esperanças, recolheu-se à sua casa, na Rua 12 Norte. Levando pela mão a passiva Elsinore, fechou com firmeza a porta às suas costas. Daí para a frente recusava-se a receber quem quer que fosse.

Assim deixou-se levar pelas torrentes crepusculares dos anos, até a enseada da Praça Marshal em West Chester.
- Antes não o tivesse feito ! Lamento ter criado o Dia das Mães !

(...) Por isso, hoje, eu me volto para a presença ausente de Anna Jarvis e suavemente lhe digo:
- Este livro é teu ! Toma-o ! É a bíblia de tua companhia, o manifesto de teu movimento. Jamais homem algum poderá mercadejar com quanto vai aqui escrito. A tua causa, pois, não está perdida!

- Depois de tantos e tantos anos, ela sorri, - a audaz mulher da Filadélfia, - e, compondo de luar um cravo-branco, atira-mo. Em sua trajetória de arco-íris, ele atravessa esta página. E leitora, eis que cai em teu regaço (...).

Prefácio de Wallace Leal V. Rodrigues, extraído do LIVRO 'MÃE', de Francisco Cândido Xavier (Casa Editora O Clarim - Matão-SP 1974).

Que possamos usá-lo para não nos deixar comprar pelos mercadores e meditar sobre o REAL significado do Glorioso "DIA DAS MÃES". A essas heroínas a quem devemos tudo o que somos, iniciando por nossas próprias vidas, ofertamos com todo nosso AMOR, o "Cravo-Branco" de Anna Jarvis !



Em memória J.R.F.








Carlos Drummond de Andrade

memórias e momentos
PROCURA DA POESIA 


Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.

Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.
Tem paciência, se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consume
com seu poder de palavra
e seu poder de silêncio.
Não forces o poema a desprender-se do limbo.
Não colhas no chão o poema que se perdeu.
Não adules o poema. Aceita-o
como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada
no espaço.

Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível que lhe deres:
Trouxeste a chave?

Repara:
ermas de melodia e conceito
elas se refugiaram na noite, as palavras.
Ainda úmidas e impregnadas de sono,
rolam num rio difícil e se transformam em desprezo.

Carlos Drumond de Andrade




"Quero sentir tua mão amiga,
junto a minha no prazer, na dor.
Assim, mesmo entoada a última cantiga,
um som há de restar do nosso amor."


"Que fiques boa depressa
de alergia ou qualquer dor,
mas que nunca sares dessa
doença de amar-me,Amor!"


"Este longo caminho percorrido
lado a lado, nos bons e maus momentos,
faz de nós dois um ser unificado
pelos mais fundos, ternos sentimentos"


"Flui a vida como água,
como água se renova.
Se a vida me foge, afogo-a
em cada esperança nova."


Carlos Drummond de Andrade
In Poesia Errante

VIDA MENOR

A fuga do real,
ainda mais longe a fuga do feérico,
mais longe de tudo, a fuga de si mesmo,
a fuga da fuga, o exílio
sem água e palavra, a perda
voluntária de amor e memória,
o eco
já não correspondendo ao apelo, e este fundindo-se,
a mão tornando-se enorme e desaparecendo
desfigurada, todos os gestos afinal impossíveis,
senão inúteis,
a desnecessidade do canto, a limpeza
da cor, nem braço a mover-se nem unha crescendo.
Não a morte, contudo.

Mas a vida: captada em sua forma irredutível,
já sem ornato ou comentário melódico,
vida a que aspiramos como paz no cansaço
(não a morte),
vida mínima, essencial; um início;um sono;
menos que terra, sem calor; sem ciência nem ironia;
o que se possa desejar de menos cruel: vida
em que o ar, não respirado, mas me envolva;
nenhum gasto de tecidos; ausência deles;
confusão entre manhã e tarde, já sem dor,
porque o tempo não mais se divide em seções; o tempo
elidido, domado.

Não o morto nem o eterno ou o divino,
apenas o vivo, o pequenino, calado, indiferente
e solitário vivo.
Isso eu procuro.

Carlos Drummond de Andrade
In Sentimento do Mundo



A Alphonsus de Guimaraens Filho

O combate da luz
contra os monstros da sombra:
assim tua poesia
é alvorada e angústia.

Pousa a morte nos ramos
do tronco apendoado.
Mas da seiva rebentam
novos, florentes cânticos.

Não pode o céu noturno
desfazer os berilos,
os íntimos diamantes
do verso teu ao mundo,

inefável presente
não de matéria vã:
do que melhor define
o fluído sentimento,

o lancinante anseio,
a sublimada essência
do amor, cativo e livre
- teu lírico segredo.

Pois pelo amor resgatas
o pensamento lúgubre,
a dor de antigas fontes,
as perdidas paragens,

e na era absurda crias
a ligação perene
da saudade dos anjos
na chama da poesia.

Carlos Drummond de Andrade
In Amar se Aprende Amando





 A dor habita em nós, o cravo a ignora.
A vida, uma gavota? Pura dança
o amor? No minueto de Lully
cabe a dificuldade de existir?

Quinta-essência do angélico, no caos,
paira a graça de Mozart sobre o abismo,
sem devassá-lo - pássaro de nuvem.
O tempo é outro metal, a comburir-nos.

Urge romper o gosto, a morna límpida,
e sangrentas estilhas do momento
passar à forma nobre da sonata.
Urge extrair do piano o som dramático.

E suscitar o diálogo patético
entre piano e violino, qual se escuta,
na penumbra da alma, as duas vozes,
um rumor de paixão se entretecendo.

Eis que a música deixa de ser pura.
Os serafins e os elfos se despedem.
A terra é lar dos homens, não de mitos.
Há  que desmascarar nosso destino.

Em tatear incessante, no conflito
corpo a corpo entre o ser e a contigência,
nova música, ungida da tristeza
mas radiante de força, vem ao mundo.

Luta  o homem na área desolada
de sua solidão; luta no palco
fremente de contrastes, percebendo
que pouco a pouco cerram-se os espaços

da percepção,  e tudo se limita
à captação interna, de sinais
silentes, impalpáveis, invisíveis,
nunca porém tão vivos se captados. 

À proporção que a dor aumenta, e em volta
nega-lhe o amor seus bálsamos terrestres,
ganha requinte a fábrica sonora
de eternizar a vida breve em arte.

Es nuss sein! É preciso! Na  amargura, 
na derrota do corpo, sublimada,
a canção do heroísmo e a da alegria
resgatam nossa mísera passagem.

E entreaberta a sinfonia suas palmas
imensas, a conter todo o rebanho
de perplexos irmãos, de angustiados
prospectores de rumo e de sentido.

para a sorte geral. O homem revela-se
na torrente melódica, suplanta
seu escuro nascer, sua insegura
visão do além, turva de morte e medo.

Ó Beethoven, tu nos mostraste o alvorecer.

Carlos Drummond de Andrade
In Discurso da Primavera e Outras Sombras



TEMPO DE IPÊ


Não quero saber de IPM, quero saber de IP.

O M que se acrescentar não será militar,

será de Maravilha.

Estou abençoando a terra pela alegria do ipê.

Mesmo roxo, o ipê me transporta ao círculo da alegria,

onde encontro, dadivoso, o ipê-amarelo.

Este me dá as boas-vindas e apresenta:

- Aqui é o ipê-rosa.

Mais adiante, seu irmão , o ipê-branco.

Entre os ipês de agosto que deveriam ser de outubro

mas tiveram pena de nós e se anteciparam

para que o Rio não sofresse de desamor, tumulto,inflação,mortes.

Sou um homem dissolvido na natureza.

Estou florescendo em todos os ipês.

Estou bêbado de cores de ipês, estou alcançando

a mais alta copa do mais alto ipê do Corcovado.

Não me façam voltar ao chão,

não me chamem, não me telefonem não me dêem 

dinheiro,

quero viver em bráctea, racemo, panícula, umbela.

Este é tempo de ipê. Tempo de glória.




Carlos Drumond de Andrade



In Amar se aprende Amando

I

Que alguém te cante e te descante,
ficou urgente, Primavera,
para que ao menos em cantiga,
neste papel aberto às gentes,
a flor antiga se restaure.

Te cantarei em Pernambuco,
onde és cidade, e no Pará,
onde mulheres plantam malva
sob o título municipal,
e em Rondônia cantarei
a corredeira Primavera,
pois nesses nomes de lugares
e num acidente geográfico
tu pousaste como um pássaro,
modesto pássaro cinzento 
de asas pretas e cauda preta,
só a lembrar, no papo branco,
extintas primaveridades.

Primavera que tanto habitas
a bráctea rósea da buganvília
( em que jardins à vista ocultos 
sob a fumaça que é nosso azul
residual?)
como habitavas, parnasiana,
o soneto crônico e clássico
dos poetas consumidores
de velhos topos europeus,
é forçoso que alguém celebre
o ímpeto juvenil da Terra
mesmo poluída, desossada,
Terra assim mesmo, seiva nossa.

E te ofereço, Primavera,
a arvorezinha de brinquedo
em pátio escolar plantada
enquanto lá fora se ensina
como derrubar, como queimar,
como secar fontes de vida
para erigir a nova ordem
do Homen Artificial.

Ah, Primavera, me desculpa
se corto em meio uma floresta
latifoliada, pois tenho pressa
de correr na estrada de Santos.
Não te zangues se já não vês
em teu perene séquito lírico
aquele sininho-flor, descoberto
em longes tempos por George Gardner
e que soava só no Brasil:
foi preciso (teria sido?)
matar o verde, substituí-lo 
pela neutra cor uniforme do progresso.

Primavera, primula veris,
em palavra quedas intacta,
em palavra pois te deponho
a minha culpa coletiva,
o meu citadino remorso
minha saudade de água, bicho,
terra encharcada de promessas,
e visões e asas e vozes
primitivas e eternas, como 
eterno ( e amoroso) é o homem
ligado ao quadro natural.

Primavera, fiz um discurso?
Primavera, tu me perdoas?...


II


22 de setembro, mina minha.
Vamos curtir a primavera
em compact cassete tape, meu morango?
Bota aí o Botticelli
estereotransfigurado em Debussy
e vê (primeiro fecha os olhos) Simonetta
Vespucci toda flor
florentil florindamente
(bulcão?) entre cordas e resinas
da flora da Tijuca...

- Não. Prefiro o Sacre du Printemps
que transa a primavera mais primavera.

Assim, no sala-e-escuro
do sala-e-quarto conjugados
os dois ficamos respirando
um princípio  de seiva e de nenúfar
enquanto a chuva - plic - tamborina
seu samba de uma nota nota só
na área de serviço.

É primavera,broto-brinco:
saiu no jornal,
a TV anunciou,
o Governo consentiu,
o Congresso aplaudiu
o comércio vendeu
arranjos de ikebana
e em algum lugar florescem três-marias
que são muitas marias, muitos nomes.

Vamos também curtir os nomes
(são presentes do povo à gente-bem):
riso-do-prado
(cadê o prado?),
amor-de-estudante
(pobre! no cursinho
que vira cursão
e invade o Brasil),
unha-de-gato
(envenenado
no Passeio Público?),
sempre-viçosa...
Isto! A esperança
pousa na balança
o seu peso-pluma.
- Você tá esquecido
da maria-branca,
da pombinha-das-almas
e da noivinha...
Asas-pseudônimos
de primavera.

(Ah, vero barato
esse de brincar
de estação das flores
de concreto-objeto!)

- Oi, depressa, vamos
semear canteiros,
preparar estacas
e mergulhões,
plantar tubérculos
de cromo -gladíolos,
túberas de dálias
e tinhorões
repicar sementeiras,
controlar lagartas,
ácaros, e trips,
dizimar pulgões.
(Ui, primavera é fogo
se levada a sério")

- Vamos pintar de verde
as áreas crestadas ,
pôr na parede
a árvore genealógica,
comprar um sábia
mecânico,
sortear
o beija-flor de beijar cimento?

É primavera, escuta o Burle Marx:
diz que havia jardins
em torno das casas,
havia matas
a cavaleiro das cidades,
florestas
onde o jacarandá e o mogno conversavam
a conversa de séculos.
(Fecharamn o bico,
chegado o eucalipto.)
Broto gentil, a primavera
será um sonho de sonhar-se
na fumaça
no grito
no sem azul deserto
das cidades mortas que se julgam vivas?

Carlos Drummond de Andrade
In Discurso de Primavera e Algumas Sombras






O último dia do ano
não é o último dia do tempo.
Outros dias virão
e novas coxas e ventre te comunicarão o calor da vida.
Beijarás bocas, rasgarás papéis,
farás viagens e tantas celebrações
de aniversário, formatura,promoção,glória,doce morte com
[sinfonia e coral,
que o tempo ficará repleto e não ouvirás o clamor,
os irreparáveis uivos
do lobo, na solidão.

O último dia do tempo
não é o último dia de tudo.
Fica sempre uma franja de vida
onde se sentam dois homens.
Um homem e seu contrário,
uma mulher e sua memória,
um olho e seu brilho,
uma voz e seu eco,
e quem sabe até se Deus...

Recebe com simplicidade este presente do acaso.
Mereceste viver mais um ano.
Desejarias viver sempre e esgotar a borra dos séculos.
Teu pai morreu, teu avô também.
Em ti mesmo muita coisa já expirou, outras espreitam a morte,
mas estás vivo.Ainda uma vez estás vivo,
e de copo na mão
esperas amanhecer.

O recurso de se embriagar.
O recurso da dança e do grito,
o recurso da bola colorida,
o recurso de Kant e da poesia,
todos eles...e nenhum resolve.

Surge a manhã de um novo ano.

As coisas estão limpas, ordenadas.
O corpo gasto renova-se em espuma.
Todos os sentidos alerta funcionam.
A boca está comendo vida.
A boca está emtupida de vida.
A vida escorre da boca,
lambuza as mãos, a calçada.
A vida é gorda, oleosa,mortal,sub-reptícia.

Carlos Drummond de Andrade
In A Rosa do Povo


A poesia é incomunicável.
Fique torto no seu canto.
Não ame.

Ouço dizer que há tiroteiro
ao alcance do nosso corpo.
É a revolução? o amor?
Não diga nada.

Tudo é possível, só eu impossível.
O mar transborda de peixes.
Há homens que andam no mar
como se andassem na rua.
Não conte.

Suponha que um anjo de fogo
varresse a face da terra
e os homens sacrificados
pedissem perdão.
Não peça.

Carlos Drummond de Andrade
In Sentimento do Mundo

Tenho razão de sentir saudade,
tenho razão de te acusar.
Houve um pacto implícito que rompeste
e sem te despedires foste embora.
Detonaste o pacto.
Detonaste a vida geral, a comum aquiescência 
de viver e explorar os rumos de obscuridade
sem prazo sem consulta sem provocação
até o limite das folhas caídas na hora de cair.

Antecipaste a hora.
Teu ponteiro enlouqueceu, enlouquecendo 
[nossas horas.
Que poderias ter feito de mais grave
do que o ato sem continuação, o ato em si,
o ato que não ousamos nem sabemos ousar
porque depois dele não há nada?

Tenho razão para sentir saudade de ti,
de nossa convivência em falas camaradas,
simples apertar de mãos, nem isso, voz
modulando sílabas conhecidas e banais
que eram sempre certezas e segurança.

Sim, tenho saudades.
Sim, acuso-te porque fizeste
o não previsto nas leis da amizade e da natureza
nem nos deixaste sequer o direito de indagar
porque o fizeste, porque te foste.

Carlos Drummond de Andrade
In Farewell
REINAUGURAÇÃO

Entre o gasto dezembro e o florido janeiro,
entre a desmitificação e a expectativa,
tornamos a acreditar, a ser bons meninos,
e como bons meninos reclamamos
a graça dos presentes coloridos.
Nessa idade - velho ou moço - pouco importa.
Importa é nos sentirmos vivos
e alvoroçados mais uma vez, e revestidos de beleza, a 
exata beleza que vem dos gestos espontâneos
e do profundo instinto de subsistir
enquanto as coisas em redor se derretem e somem
como nuvens errantes no universo estável.
Prosseguimos. Reinauguramos. Abrimos olhos gulosos
a um sol diferente que nos acorda para os
descobrimentos.
Esta é a magia do tempo.
Esta é a colheita particular
que se exprime no cálido abraço e no beijo comungante,
no acreditar na vida e na doação de vivê-la
em perpétua procura e perpétua criação.
E já não somos apenas finitos e sós.
Somos uma fraternidade, um território, um país
que começa outra vez no canto do galo de 1º de janeiro
e desenvolve na luz o seu frágil projeto de felicidade.

Carlos Drummond de Andrade
In Farewell



Eu te amo porque te amo.
Não precisa ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.

Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.

Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.

Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem ( e matam)
a cada instante de amor.

Carlos Drummond de Andrade


A dança? Não é movimento

súbito gesto musical

É concentração, num momento,

da humana graça natural



[Carlos Drummond de Andrade]
O PLURIVERSOS E NÓS



Além da Terra, além do Céu,
no trampolim do sem-fim das estrelas,
no rastro dos astros,
na magnólia das nebulosas.
Além, muito além do sistema solar,
até onde alcançam o pensamento e o coração,
vamos!
vamos conjugar
o verbo fundamental essencial,
o verbo transcendente, acima das gramáticas
e do medo e da moeda e da política,
o verbo sempreamar,
o verbo pluriamar,
razão de ser e de viver.

[Carlos Drummond de Andrade, Além da terra, além do Céu]



TEMPO DE IPÊ









Não quero saber de IPM, quero saber de IP.


O M que se acrescentar não será militar,

será de Maravilha.

Estou abençoando a terra pela alegria do ipê.

Mesmo roxo, o ipê me transporta ao círculo da alegria,

onde encontro, dadivoso, o ipê-amarelo.

Este me dá as boas-vindas e apresenta:

- Aqui é o ipê-rosa.

Mais adiante, seu irmão , o ipê-branco.

Entre os ipês de agosto que deveriam ser de outubro

mas tiveram pena de nós e se anteciparam

para que o Rio não sofresse de desamor, tumulto,inflação,mortes.

Sou um homem dissolvido na natureza.

Estou florescendo em todos os ipês.

Estou bêbado de cores de ipês, estou alcançando

a mais alta copa do mais alto ipê do Corcovado.

Não me façam voltar ao chão,

não me chamem, não me telefonem não me dêem 

dinheiro,

quero viver em bráctea, racemo, panícula, umbela.

Este é tempo de ipê. Tempo de glória.




Carlos Drumond de Andrade

In Amar se aprende Amando




AMAR,VERBO INTRANSITIVO!



Quando encontrar alguém e esse alguém 
fizer seu coração parar de funcionar por alguns segundos,
preste atenção: pode ser a pessoa
mais importante da sua vida.



Se os olhares se cruzarem e, neste momento,
houver o mesmo brilho intenso entre eles,
fique alerta: pode ser a pessoa que você está
esperando desde o dia em que nasceu.



Se o toque dos lábios for intenso,
se o beijo for apaixonante, e os olhos se encherem
d'água neste momento, perceba:
existe algo mágico entre vocês.



Se o primeiro e o último pensamento do seu dia 
for essa pessoa, se a vontade de ficar
juntos chegar a apertar o coração, agradeça:
Algo do céu te mandou 
um presente divino : O AMOR.



Se um dia tiverem que pedir perdão um 
ao outro por algum motivo e, em troca,
receber um abraço, um sorriso, um afago nos cabelos
e os gestos valerem mais que mil palavras,
entregue-se: vocês foram feitos um para o outro. 



Se por algum motivo você estiver triste,
se a vida te deu uma rasteira e a outra pessoa
sofrer o seu sofrimento, chorar as suas lágrimas
e enxugá-las com ternura, que
coisa maravilhosa: você poderá contar 
com ela em qualquer momento de sua vida.



Se você conseguir, em pensamento, sentir
o cheiro da pessoa como
se ela estivesse ali do seu lado... 



Se você achar a pessoa maravilhosamente linda,
mesmo ela estando de pijamas velhos, 
chinelos de dedo e cabelos emaranhados...



Se você não consegue trabalhar direito o dia todo,
ansioso pelo encontro que está marcado para a noite...



Se você não consegue imaginar, 
de maneira nenhuma, um futuro sem a pessoa ao seu lado...



Se você tiver a certeza que vai ver a outra 
envelhecendo e, mesmo assim, tiver a convicção
que vai continuar sendo louco por ela...



Se você preferir fechar os olhos, antes de ver
a outra partindo: é o amor que chegou na sua vida.



Muitas pessoas apaixonam-se muitas vezes 
na vida poucas amam ou encontram um amor verdadeiro. 



Às vezes encontram e, por não prestarem atenção
nesses sinais, deixam o amor passar,
sem deixá-lo acontecer verdadeiramente.



É o livre-arbítrio. Por isso, preste atenção nos sinais.



Não deixe que as loucuras do dia-a-dia o deixem 
cego para a melhor coisa da vida: o AMOR! 



Carlos Drummond de Andrade